Esta plaquete nasceu de uma conversa.
Uma conversa entre o menino de dez anos que eu fui, que sentiu o mundo ficar mais calado com a morte de Raul, e o pai que sou hoje, que vê nos olhos dos filhos a mesma faísca de espanto ao ouvir aquele trovador. A série da GloboPlay foi o estopim, mas a pólvora era a memória, o desejo de traduzir para os meus filhos — e para mim mesmo — a anarquia sagrada daquele homem que fez do rock um rito e da loucura um evangelho.
No fundo, eu estava tentando capturar um relâmpago numa garrafa. A obsessão não era Raul, o homem que morreu, mas a centelha que ele deixou acesa. Queria mostrar como sua obra não é um objeto de museu, mas um mapa vivo que nos devolve ao agora com olhos queimando. Cada carta, cada álbum, é uma estação nessa jornada que nos ensina a ser o que se é, a rir do diabo e a encontrar lucidez na loucura.
A forma de "cartas" foi a única que me pareceu honesta. Eu não queria explicar Raul, queria conversar com ele. A prosa poética é o corpo da carta, onde eu dialogo com a memória de cada álbum. O poema curto que a finaliza é o eco, o silêncio que fica depois que a agulha repousa no vinil, a tentativa de capturar a essência de cada um daqueles universos em poucas palavras.
Acho que a primeira carta, a que evoca o Krig-Há, Bandolo!, é a chave de tudo. É o "berro inicial" que rasga o tédio e a mentira confortável. Ali está o DNA da plaquete inteira: a ideia de que a música de Raul não é um convite à certeza, mas ao erro com estilo , um chamado para que nossa alma mude de pele no ruído da agulha. Sem aquele grito, nenhuma das outras conversas seria possível.
A voz que fala aqui é despudoradamente a minha, em suas várias camadas. É a voz do menino de 1989 , a do poeta que tenta rezar com palavras , e, principalmente, a do pai que busca construir uma ponte entre o passado e o futuro para seus filhos. Não há máscara. Sou eu, com meus discos, minhas memórias e a tentativa de partilhar essa faísca com quem amo.
Minha esperança com esta plaquete é que ela funcione como uma ponte. Uma ponte para que novos ouvintes, talvez "os filhos do amanhã", possam atravessar e encontrar esse continente chamado Raul Seixas. Não é um guia, é um convite. Um convite para sentir como a coragem de ser você mesmo, até o fim, é um gesto que vale mais que qualquer certeza.
Hoje, vejo que Raios, Raul, Relâmpagos foi menos sobre Raul e mais sobre o tempo. Sobre como uma voz pode atravessar décadas e continuar nos ensinando a viver. A plaquete me ensinou que escrever é uma forma de garantir que as conversas importantes não morram.
E a conversa com Raul, felizmente, é uma conversa sem fim.
Vou adorar dividir minha experiência com você.
No meu site tem link para a plaquete.