Esta plaquete nasceu de um impacto, da sensação de ser atravessado por um vento que não pede licença.
Ouvir Elis é como ouvir um trovão: a gente sabe que algo vai mudar, que a chuva que limpa e acorda está a caminho. Senti a necessidade de mapear essa força da natureza, de entender como uma única garganta pôde conter, ao mesmo tempo, a pimenta da fúria e a doçura do afeto. A escrita foi minha forma de responder a essa tempestade.
A obsessão que costura esta obra é o paradoxo. Como a mesma voz podia ser, ao mesmo tempo, navalha e colo, punho e beijo? Eu queria investigar essa força contraditória, essa capacidade que ela tinha de encarnar a dor e a esperança de um país inteiro. A plaquete é uma tentativa de desenhar o contorno dessa tempestade, de mostrar que sua arte não era só música, mas uma trincheira existencial.
A arquitetura da plaquete, com as cartas e os poemas-ecos, busca dar conta dessa dupla natureza de Elis. A carta em prosa é a crônica, a minha conversa com a intérprete que forjou uma carreira e se tornou um emblema do Brasil. O poema curto é o relâmpago, o eco da sensação que a voz dela, como força bruta, deixa na pele. É a junção do percurso e do impacto.
Se há um momento em que a plaquete encontra seu centro, é na carta sobre Falso Brilhante. Ali, Elis se torna conscientemente o "espelho do país". "Como Nossos Pais" não é mais só uma canção, é o "inventário da desilusão coletiva". Aquele espetáculo é a síntese da sua arte: a fusão completa entre a biografia pessoal e a história de uma nação. É o palco onde ela é, ao mesmo tempo, "farol e ferida".
A voz que fala aqui é a de quem se reconhece na ventania. É uma voz que não tenta explicar Elis, mas que testemunha o efeito que ela provoca. É a voz de alguém que aprendeu com ela que o corpo inteiro pode ser um instrumento de expressão e que a beleza pode ser uma forma de luta. É a minha homenagem à mulher que fez da própria garganta uma trincheira.
Minha esperança com esta plaquete é que ela funcione como uma faísca. Que, ao ler, as pessoas sintam vontade de reouvir Elis, não com nostalgia, mas com a atenção voltada para a potência que permanece. Queria que os textos servissem como um convite para deixar esse vento entrar em casa de novo, para varrer a poeira da conformidade e nos lembrar da força que uma voz pode ter.
Hoje, vejo Pimenta, Elis, doçura como a minha celebração da coragem. A plaquete me ensinou que interpretar não é repetir, mas recriar o mundo a cada canção. É a minha constatação de que algumas vozes não passam pelo tempo; elas se tornam o próprio tempo, um vento que nunca para de soprar. Elis não é uma lembrança; é uma presença contínua.
Adoraria dividir esta experiência com você.
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