O frio da alma não se desfaz com o verão — só o gesto acende primaveras eternas.
o frio chega como um bicho lento, mastigando o ar até que a respiração se transforme em nuvem. os dias se recolhem cedo, e o sol, tímido, parece pedir desculpas pela ausência. há um silêncio gelado que veste as ruas, e as mãos procuram bolsos como quem busca abrigo no próprio corpo.
mas o inverno mais cruel não vem do clima. há olhares que não aquecem, palavras que não vestem, gestos que não socorrem. há corações que, mesmo sob o céu limpo, exalam um vento cortante. gente que aprendeu a medir a vida pelo que retém, e não pelo que oferece.
mal sabem — esses que confundem dureza com força — que o gelo que acumulam dentro é só um prenúncio. o inferno que os espera não é de chamas, mas de ausência de calor: um deserto de gelo eterno, onde ninguém lhes estende a mão, e onde suas próprias palavras retornam como sopros frios contra o rosto.
é por isso que, no inverno, se deve abraçar mais forte, porque sabe-se que o calor que se dá agora pode salvar do frio que se acumula para sempre.
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