Esta plaquete não nasceu de uma escolha, mas de uma convocação.

A voz de Mateus Aleluia me impôs um silêncio reverente, uma escuta demorada que me conectou com algo muito anterior a mim. Senti que a única resposta honesta a essa experiência seria a escrita, não como análise, mas como um gesto de gratidão. Escrevi como quem acende uma vela, tentando, com palavras, honrar a luz que aquela voz trouxe à minha própria escuridão.

A obsessão que move esta plaquete é o som como lugar do sagrado. Eu queria mapear como a voz de Mateus Aleluia constrói templos, evoca entidades e nos reconecta com uma ancestralidade que o tempo tentou apagar. Não é sobre música, no sentido comum. É sobre como uma frequência sonora pode se tornar um terreiro, uma oferenda, uma oração. A obra inteira é uma meditação sobre a voz como fundação de um espaço espiritual.

A arquitetura da plaquete, com cartas e poemas-ecos, foi a única que me pareceu respeitosa. A carta em prosa é a minha tentativa de contornar o mistério, de descrever a experiência de escutar cada álbum. O poema curto, por sua vez, é a minha rendição ao mistério. É a prece que resta quando as explicações se calam. É o meu amém depois da escuta.

A chave de toda a plaquete está na carta dedicada a O Africanto dos Tincoãs. É ali que a música deixa de ser música para se tornar terreiro. Aquele álbum é a grande oferenda, "o Cântico dos Cânticos do Candomblé" . É o momento em que a voz de Mateus se torna, inequivocamente, fundação. Todo o resto da obra, incluindo sua carreira solo, é um desdobramento daquele ato sagrado de invocação.

A voz que fala aqui é a de quem se ajoelha para escutar. É uma voz que se esvazia de si para ser preenchida pela frequência do outro. Ela não analisa, ela reverencia. Não explica, ela sente. É a minha voz como devoto, não de uma religião, mas da beleza e da profundidade ancestral que o canto de Mateus Aleluia evoca.

Minha esperança, com esta plaquete, é que ela funcione como um convite ao silêncio. Um convite para que o leitor pare, respire e se permita ser tocado por essa voz que vem da terra. Não quero que entendam Mateus Aleluia através de mim, mas que, através destas páginas, sintam o desejo de fazer sua própria escuta, de acender sua própria vela nesse altar de som e afeto .

Hoje, vejo que Aleluia, Mateus, Infinito me ensinou sobre a humildade. Ensinou-me que a poesia mais potente nem sempre está nos livros, mas na voz que sustenta uma comunidade, que carrega a memória de um povo. Esta plaquete é o meu reconhecimento de que o ato poético mais elevado é aquele que, como o de Mateus, se torna um ato de cuidado com o sagrado que nos habita.

Deixo o convite: venha celebrar o sagrado que Mateus Aleluia canta.

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@giovanimiguez

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Giovani Miguez

SOBRE O AUTOR

Giovani Miguez

Poeta, escritor (mais de 20 livros publicados) e pesquisador. Doutor e mestre em Ciência da Informação (IBICT/UFRJ). Especialista em Psicanálise e Psicologia. Graduado em Gestão Pública com Extensão em Jornalismo de Políticas Públicas. Analista de Ciência e Tecnologia na Coordenação de Ensino do Instituto Nacional de Câncer (INCA). Atualmente, além das pesquisas em Filosofia da Ciência da Informação (Antropologia Filosófica e Documentalidade), pesquisa também sobre Cuidado Narrativo, Cuidado Oncológico, Trabalho em Saúde e Informação em Saúde.

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